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GRUPOS, IDÉIAS E MILITÂNCIA – PARTE 3

Outro conflito importante no qual estiveram envolvidos os constituintes santistas foi o ocorrido entre os anos de 1893 a 1895, quando houve no país a chamada Revolta da Armada, contra o governo autoritário de Floriano Peixoto. Este justificava suas atitudes autoritárias e centralizadoras com o argumento de proteger a república. Muitos dos republicanos, no entanto, entenderam que a república, na realidade, estava sendo usurpada com a falta da legalidade e cerceamento da liberdade.
Segundo Olao Rodrigues:
Santos [...] se mostrava politicamente agitada em conseqüência dos acontecimentos de 1893, dividindo-se os florianistas em dois grupos influentes, um sob a chefia do Dr. Manuel Maria Tourinho e o outro liderado por Américo Martins dos Santos(1979, p. 70)
No entanto, podemos perceber que havia um grupo de apoiadores dos revoltosos. De fato, “os antiflorianistas, numerosos em Santos, aquela altura, ainda teimavam em não ceder em seus direitos de opinião” (SANTOS, 1986, p. 257). Isso porque: “[...] os bons republicanos de Santos não simpatizavam com Floriano e seu tipo ditatorial de governo, e o declararam em reuniões e pela imprensa [...]” (idem, p. 263)
O próprio jornal Tribuna do Povo serviu para os opositores divulgarem sua opinião:
Em seus ataques, logo no lançamento do jornal, Olympio acusa Floriano de tirania, despotismo e bonapartismo, chamando-o, entre outras coisas, de “o carniceiro do Paraguai” e “salteador”. Em conseqüência o jornal foi empastelado logo após o primeiro número, em março de 1894. (ALVES, 2008 p. 32)

Houve perseguição política, cassação de mandatos de vereadores, empastelamento dos jornais, pelas mãos dos aliados santista:
Tribuna do Povo seria empastelado mais duas vezes: em abril de 1895 e em dezembro do mesmo ano, pouco depois da depredação do jornal Santos Commercial. Participou das ações de vandalismo o chamado Batalhão Patriótico Silva Jardim, liderado por Quintino de Lacerda, que atuava a mando do presidente do estado (hoje denominado governador), Bernardino de Campos (ALVES, 2008 p. 33)
Protestou Manuel Maria Tourinho contra o estado de sítio estabelecido na cidade. Este, que presidia a edilidade neste período, se recusou a comparecer nas sessões enquanto durasse o período de exceção. Vicente de Carvalho[1] era outro que estava ao lado dos revoltosos. Isso porque faziam parte dos “republicanos ortodoxos, da ala oposicionista, [...] afastada do presidente”. [...] Nesse Clube (Republicano) estava a mais aguerrida gente republicana” (SANTOS, 1986, p, 259)        
Podemos ver que, no ano de 1893, os vereadores se dividiram em dois grupos com opiniões opostas sobre a Revolta. É o próprio Tourinho que nos fala sobre a divisão entre os vereadores santistas:
“Todos sabem que, durante a revolta, a maioria da camara municipal de Santos, rindo-se da tibieza dos chefes oposicionistas, continuou no seu posto de honra, protestando, tanto quanto podia, contra a ditadura ferrenha que nos humilhou” (Tribuna do Povo, 8/1/1896 in Coleção Costa e e Silva)
        Assim, vemos que ao contrário do que se costuma afirmar, haviam divergências de idéias entre os políticos da cidade, e mesmo entre os republicanos santistas.
No seu primeiro relatório como presidente da Câmara, Manuel Maria Tourinho deu mostras de como foram conflituosos os primeiros tempos da primeira Câmara eleita:
“Tem sido, sem duvida alguma, cheia de peripécias a vida da Camara municipal de Santos de um ano a esta parte.
Despeitados adversários políticos, na faina de empolgarem o poder, de tudo lançaram mão.
Intrigas, denuncias, infâmias, cartas anônimas e até ataques flagrantes à Constituição do Estado, tudo foi julgado legitimo para a posse do governo municipal.
Felizmente o patriotismo, a dedicação e a invejável tenacidade da camara, tudo venceram, tudo aniquilaram obrigando os adversários a abandonarem o campo verdadeiramente derrotado e até corridos pelo povo, juiz imparcial em legitimo em semelhantes casos.
Ainda bem. Foi uma verdadeira vitoria, epilogada pela consagração que as urnas acabão de fazer ao partido em oposição.( RELATÓRIO de 1894)

Dos fatos e informações acima podemos concluir que foi mais por motivos políticos do que jurídico/constitucionais que a Constituição Santista foi anulada. Foram muitos os conflitos e o preço pago pelas divergências políticas foi a anulação da Lei Santista, por motivos políticos e não jurídico-constitucionais.
Aliás o próprio Tourinho dá mostras de que foi por motivos políticos que a Constituição Municipal foi anulada, quando tratou desse período como:
“[.,..] uma época em que a bachareilice, ignorante e presunçosa, começava a dar golpes na autonomia do município, derruindo, com auxílio criminoso do governo e de uma oposição apenas rotulada com este nome, a conquista grandiosa da emancipação de Santos[...]” (Tribuna do Povo, 8/1/1896 in Coleção Costa e e Silva)
Como vemos muitos, e graves, eram os conflitos entre os republicanos santistas, espelho dos conflitos entre os ideais republicanos que se colocavam em prática. Conflitos estes que não se limitavam ao debate de idéias, mas passavam pela cassação de mandatos, pela agressão física, e mesmo pela pressão política. E tudo isso vai influencia tanto a feitura, como a anulação da Constituição Política de Santos.




[1] Vicente de Carvalho ajudou o general Rebelde Couto de Magalhães a se refugiar em Bertioga durante o conflito, o que mostra seu apoio aos revoltosos.

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