A
Educação foi formada historicamente como uma ciência, construída através dos
anos, por meio de escritos, debates e discussões, com a contribuição de
diversos pensadores. Cada período trazia consigo uma nova questão a ser
debatida, um novo problema e consequentemente uma nova proposta para a educação
dos homens.
A
própria ideia de escola, que nos parece tão enraizada e rígida, como se sempre
existisse e estivesse presente na história, foi construída e modificada.
Dominique Julia, em seu “clássico” texto sobre cultura escolar (2001), se
propõe a refletir sobre esse conceito a partir de um determinado recorte
temporal, séculos XVI e XIX, justificando:
“Esses três
elementos, espaço escolar específico, cursos graduados em níveis e corpo
profissional específico, são essenciais à constituição de uma cultura escolar e
justificam, portanto, a restrição cronológica que me impus” (JULIA, p. 15)
Tais elementos, conforme explicitados pelo próprio autor, são os
constitutivos de uma cultura própria da instituição escolar, que surgiu,
portanto, historicamente.
Durante o
século XVI há a sedimentação da ideia que o ensino deveria se dar em um espaço
escolar à parte, com um edifício, um mobiliário e um material específicos. Esse
ideal se desenvolve a partir do modelo das Escolas Cristãs de Jean-Baptiste de
La Salle[1], que por
sua vez havia se inspirado nas experiências das escolas paroquiais e colégios
de seu tempo.
Durante os
períodos seguintes, desenvolve-se o modelo ideal da separação do curso em
classes separadas.
Há a ideias
de uma educação elementar, das bases do conhecimento, especialmente a
catequese, ler, escrever e contar, e uma educação “superior”, voltada para a
formação das elites. (JULIA, 2001 p. 26)
E a partir
do século XVI que nascem os corpos profissionais que se especializam na
educação, quando as congregações religiosas definirão pré-requisitos ou
qualidades essenciais[2] àqueles
que se dedicarão ao ofício do ensino. Esse início da profissionalização se dá
com a Reforma Protestante e Concílio de Trento, quando os religiosos percebem a
importância e a necessidade de conhecer os elementos da fé.
Portanto a escola
tem sua criação e desenvolvimento acompanhando as mudanças históricas e de
pensamento. A forma mediante a qual a escola transpõe didaticamente os saberes
é diretamente interligada ao modo pelo qual, historicamente, ela se apropria
deles. Poderíamos, inclusive, dizer que os saberes da escolarização são
desenhados à imagem e semelhança dessa escola: em seu compasso, em seu traçado.
(BOTO, 2007, p. 19)
Com o
Renascimento, e o Humanismo, sua expressão letrada, há uma transformação
cultural da sociedade, e na própria concepção de Homem, que passa a ser
entendido como em formação, e não mais dado pronto e acabado. Como podemos
perceber, por exemplo, em Montaigne
Viso aqui apenas
revelar a mim mesmo, que porventura amanhã serei outro, se uma nova
aprendizagem mudar-me.(MONTAIGNE, 2005, p. 39)
O ser
humano passa a ser visto como capaz de fazer-se a si próprio, ou seja, não
nascem prontos mas são educados. Nessa época há uma preocupação com a criança,
em parte por conta da menos mortalidade infantil, que proporcionará maior
atenção à sua formação.
Muitos autores
consideram Erasmo o primeiro pensador a compilar um método de conduta considerado
relevante para o período, pois escreve aos pais,
preocupado com a formação do jovem, que sem o preceptor e a formação correta
poderia se descaminhar para os vícios de sua própria vontade.
A arte de instruir
crianças consta de diversas etapas. A primeira e a principal consiste em
fazer com que o espírito ainda tenro receba as sementes da piedade; a segunda,
que tome amor pelas belas artes e as aprenda bem; a terceira que seja iniciada
nos deveres da vida; a quarta, que se habitue, desde cedo, com as regras da
civilidade. (ERASMO, 2011).
Mais tarde o luteranismo
vai estimular a leitura da Bíblia e desde o início vai incentivar a
alfabetização de todos, com a criação de escolas. Nessa concepção de educação a
escola tem sua finalidade religiosa, mas também sua finalidade civil, já que
deverá formar meninos para governarem as cidades e as meninas para administrar
a casa e a família.
Mesmo que (como já
disse) não existisse alma e não se precisasse das escolas e línguas por causa
da Escritura e de Deus, somente isso já seria motivo suficiente para instituir
as melhores escolas tanto para meninos como para meninas em toda parte, visto
que também o mundo precisa de homens e mulheres excelentes e aptos para manter
seu estado secular exteriormente, para que então os homens governem o povo e o
pais, e as mulheres possam governar bem a casa e educar bem os filhos e a
criadagem (LUTERO, 1995, p. 318)
Lutero vai se preocupar com uma educação cristã, mas de
crianças para prepará-las para uma sociedade cristã. Seu argumento é religioso,
mas sua lógica era política.
O Estado devia manter o controle da educação, que é muito
importante para ficar nas mãos de uma religião ou mesmo dos pais.
Muitos pesquisadores concordam
que o modelo da escola moderna surge na escola lassalista da França no fim do
século XVI:
“Guy Vincent considerava que a forma escolar criada por La Salle havia
sido mantida em sua essência (permanecendo como tal até os dias de hoje). Para
Vincent, a alteração fundamental foi operada em grande parte pela passagem de
uma cultura fundada na oralidade para uma cultura escritural, baseada na
difusão da palavra escrita (crescimento da alfabetização), mas principalmente
na organização do pensamento e da relação do homem com o mundo pela lógica
escritural” (VIDAL 2005 p. 38)
La Salle desenvolve um modelo de aprendizagem que se realiza
especificamente na escola, um local específico, separado do restante da
sociedade, e não mais em família. A aprendizagem passa a ter um sistema, um
modo de se dar, que é a base do padrão que servirá os séculos a seguir.
É a
partir desse momento histórico, já no início do século XIX, quando havia uma
ideia de escola e de escolarização modernas em constituição, que surge a
Pedagogia de Herbart.
Esse autor vai partir de uma visão própria de aluno e
professor, desenvolver um sistema de ensino e de pedagogia e praticamente criar
a Ciência da Educação. Ele cria a ideia da Pedagogia como ciência, com a
participação da ética e da psicologia, fundamentação de uma ciência pedagógica
que diferia da arte educativa de até então. A Psicologia é ciência da natureza
humana, física (dinâmica e estática) da psique, dimensão intelectual. A Ética é
ciência da moralidade, processo de aperfeiçoamento do caráter humano, dimensão
moral e estética.
Herbart tem como filiação filosófica a crítica ao idealismo,
com a defesa de um neo-humanismo, com a valorização dos estudo dos clássicos
(principalmente gregos) e matemática, sob a inspiração de Pestalozzi.
Ele parte da ideia de uma formação do homem na sua inteireza, integralidade da
educação do homem, humanidade.
[1] La Salle foi o criador de um Instituto de Leigos que
se excluem, por vocação, da cultura das elites para se consagrarem às escolas
de caridade destinadas aos mais pobres.
[2] A Companhia de Jesus previa um exame geral que
julgava a inteligência, perspicácia, devoção e saúde. Oratorianos exigiam
qualidades físicas e inclinação para as ciências. Na Universidade de Paris
procurava-se identificar os melhores alunos e ensinar-lhes progressivamente.
Exigia-se caráter, piedade e costumes. (JULIA 2001, p. 27)
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